Ciao!!!
Muitas pessoas têm uma visão romântica do jornalismo.
Pensam no profissional como aquele que não hesita em correr atrás da verdade nas histórias, vivem vidas boêmias e estão dispostos a salvar o mundo. E no caso dos jornalistas que trabalham com música, a gente pensa no glamour, no brilho, na aparente perfeição que desperta inveja.
Pois este livro, mostra em vários exemplos que não é bem assim.
Fama & Loucura – Neil Strauss – Best Seller
(Everyone loves you when you’re dead – 2011 – Stately Plump Buck Mulligan)
Livro com jornalista? Ainda mais relatando entrevistas? Estou dentro!
Fazer entrevistas é muito complicado, em qualquer circunstância.
Primeiro, porque nem sempre você está preparado o suficiente.
Segundo, porque há entrevistados que te derrubam no “boa tarde”.
Terceiro, porque nem sempre eles gostam do que você vai perguntar.
Quarto, porque eles ou você podem estar em um mau dia.
Eu poderia continuar listando vários outros problemas e limitações aqui. E nem sempre ter um excelente texto ajuda, se você não é capaz
de conseguir a matéria-prima, que é informação da fonte. Afinal de contas, jornalismo é narrativa de fatos, não uma criação de ficção.
Por isso quis ler este livro de Neil Strauss (confesso, não o conhecia). Sou fã de muitos artistas que ele entrevistou e queria analisar o resultado como fã e como jornalista. Sem contar que, se algum dia, eu voltar às salas de aula como professora, terei bom material para explorar com os alunos.
Neil dividiu as 228 entrevistas que fez para diferentes meios de comunicação – entre eles, Rolling Stones e o The New York Times -, dividiu em dez capítulos com títulos que fazem referências diretas ao que foi dito nas entrevistas a que fazem parte do trecho a seguir.
Outra coisa que gostei é que ele dividiu as entrevistas mais longas em cenas, abertas por uma explicação prévia sobre o entrevistado ou as circunstâncias do encontro. E ainda conta com notapés que corrigem ou complementam informações ditas na entrevista. E a forma como ele encadeou as cenas de diferentes entrevistados faz o texto ter uma fluidez incrível, porque muitas vezes os assuntos se encaixam, complementam, o pensamento parece ter uma sequência, mesmo vindo de pessoas diferentes e em contextos distintos.
O relato de Neil revela também a capacidade do entrevistador em lidar com o entrevistado. Na sensibilidade em ouvir, saber explorar os assuntos e em lidar com o que o entrevistado oferece. Em alguns momentos, você consegue imaginar a cena descrita. E se adaptar às
circunstâncias, desde sair para comprar fraldas com o Snoopy Dogg, participar de uma competição maluca com o Ludarcris.
Eu li todo o livro. Todo. 523 páginas. Então, decidi elencar aqui meus momentos favoritos. Óbvio que passam pelos fatores: jornalista, tiete e surpresa.
* Ato 1: de um modo geral, aqui não vou me ater a entrevistas particulares, é de dar desespero em qualquer jornalista. Afinal de contas, ele condensou neste capítulo “A pior entrevista de todos os tempos”. Desinteresse, má vontade, falta de educação, crise pessoal, faniquito, gente que se acha após o primeiro sucesso… Eu disse que o jornalismo não tem esse glamour todo que o povo pensa. Este capítulo me fez querer ler as matérias que resultaram destas entrevistas só para ver como Neil Strauss descascou os abacaxis que encontrou nesta parte…
* Lady Gaga (Ato 2): ainda não tenho opinião formada sobre ela. Gosto de algumas músicas, mas ainda fico muito perdida com o que ela
quer dizer, se é que que ela quer dizer alguma coisa… No entanto, gostei muito do rumo que a conversa tomou. Fiquei com uma impressão positiva (ao contrário da entrevista dele com o Tom Cruise que só reforçou a imagem mental de “será que ele está bem?” que eu tenho dele).
* The Neptunes (Ato 6): a missão era entrevistar Pharrell Williams, que junto com Chad Hugo, estava por trás dos sucessos de vários artistas. São cinco cenas, que relatam a íntegra de todas as tentativas de contato. Mas o trem se revelou uma missão praticamente impossível, ao ponto de exigir do jornalista uma “solução alternativa” para ter a matéria pronta.
* Cher (Ato 6): Gente, é a CHER. Nem com toda pesquisa do mundo eu conseguiria entrevistá-la. E as duas cenas relatam um encontro “casual”
e os bastidores que levaram a música “Believe” ao #1 das paradas, mesmo após a confusão que foi o processo criativo e que, pelo visto, ainda deixou gente insatisfeita.
* Backstreet Boys (Ato 6): Ok, essa foi totalmente inesperada. Eu nunca iria imaginar que leria Backstreet Boys neste livro, ainda mais sendo uma entrevista em três cenas com Kevin Richardson, o mais velho do grupo e o meu favorito. E foi uma entrevista sobre os bastidores de fazer parte de uma banda fabricada, os problemas que existiram quando a “traição” veio de onde não se esperava e quando o tempo passa e traz outras prioridades da vida.
* Estátuas de Cera (Ato 5): disparado a melhor pauta do livro. Você já parou para pensar o que acontece com estátuas de cera quando
um museu delas fecha? Neil recebeu uma dica do destino das estátuas do Country Music Wax Museum, de Nashville. A maior curiosidade era que as estátuas usavam roupas e acessórios originais dos homenageados, o que aumentava ainda mais o valor delas. Não vou contar o desfecho, mas foi uma jornada muito interessante.
* A cidade racista (Ato 8): na minha opinião, outra grande pauta do livro (apesar de eu, pessoalmente, preferir a do museu de cera). Já imaginou um lugar onde todos odeiam negros e manifestam isso abertamente? Skullbone, no Tennessee, é assim. É uma herança histórica da qual eles se orgulham e fazem questão de manter viva. Eu sei que existe este tipo de comportamento em vários lugares do mundo, mas ainda assim fiquei perplexa.
* The Funerals (Ato 8): acompanhar a turnê de uma banda de country lento e triste da Islândia pelo país. Preciso dizer mais alguma coisa?
* Copidesques (Ato 8): Uma figura que desapareceu das redações com as novas formatações, equipes mais enxutas. Ele era responsável por revisar o texto, em busca de erros gramaticais e ortográficos. Nos casos citados pelo autor, funcionaram como uma instância de censura disfarçada de “respeito aos padrões de decência”.
* Perfil de Paul Nelson (Ato 10): a história que encerra o livro é a narrativa do autor ao fazer um perfil sobre Paul Nelson, considerado o primeiro e melhor crítico de rock dos Estados Unidos. Não vou dar detalhes, mas posso garantir que não foi à toa que ela ficou por último.
* Epílogo: Ele resume as lições que tirou ao longo da carreira, entrevistando todo tipo de gente que viveu das melhores às piores experiências em busca da fama ou após ter reconhecimento. Serve como lição de jornalismo e de vida. E só foi aqui que ele explica o título original – Everyone loves you when you’re dead – uma conclusão cínica, dura e real sobre a vida em geral e o show bizz em particular.
Arrivederci!!!
Beta
Muito interessante como sugestão de leitura. Esse autor escreveu um livro com bastante fluidez por entre assuntos diferentes, embora sob formato igual, como você descreveu,o que tem condão de ter sido muito complicado, exigindo bastante talento de escritor e habilidade de jornalista, pois não é fácil conectar fluidez de uma escrita relatando fatos de vidas diferentes de pessoas diferentes como se formassem uma seqüência. Ótimo !